A reativação formal da “Rede Vida”, com a apresentação pública do Estatuto e do Regulamento num workshop, seria um dos momentos altos dos “16 dias de Ativismo”. O período se assinala entre 25 de novembro, Dia Internacional para a Eliminação da Violência contra as Mulheres, e 10 de dezembro, Jornada Mundial dos Direitos Humanos.
“Assumimos o desafio da reativação da ‘Rede Vida’. Estamos a fazer várias atividades em conjunto. Mas antes, gostaríamos de ter um documento que desse sustentabilidade à ‘Rede Vida’. O Estatuto já está elaborado. Porém, está ligeiramente atrasado, porque foi remetido ao gabinete da presidência para aprovação. Partimos do princípio que ainda este ano teremos o referido documento. Por isso, tivemos que adiar o ateliê programado para a formalização da Rede”, declarou a diretora do Centro de Aconselhamento e Combate à Violência Doméstica (CACVD).
Porém, isso não impediu que os 16 dias de Ativismo fossem dinamizados pela Rede Vida, que aliás já tem uma estrutura: o CACVD assume a presidência da Rede; a Polícia Nacional, a vice-presidência e a Associação de Mulheres Juristas (ASMJ), o Secretariado.
As atividades programadas incluem ações de sensibilização sobre abusos sexuais e violência, com base em palestras e projeção de filmes, seguidos de debate, entre duas e quatro escolas mais frequentadas nos distritos e na Região Autónoma do Príncipe, sendo os estudantes de 5ª e 6ª classes o principal grupo-alvo.
Visitas às vítimas de Violência baseada no Género e Mesa Redonda relacionada com o tema, a marcha e feira vinculadas com a celebração do Dia Mundial de Combate a VIH/Sida, no distrito de Mé-Zóchi fizeram igualmente parte do calendário,
“No decorrer da campanha, apuramos que as situações de abuso e violência ocorrem no seio da família: pai, padrasto, avô, primo, estão envolvidos, de acordo com as queixas recebidas”, esclareceu Sónia Afonso.
A responsável destacou o papel dos professores e principalmente as professoras que ‘têm estado a ajudar bastante. Com algumas denúncias feitas pelas professoras, mesmo de forma anónima, tomamos contacto com os casos e vamos a escola para confirmar, de modo a dar o tratamento mais adequado”.
A diretora da CACVD apelou aos professores que “nos informem sobre qualquer situação de maus tratos. Se não puderem trazer a vítima, nós iremos ao vosso encontro para obter informações mais precisas e fazer o devido encaminhamento”.
“Estamos a elaborar novas estratégias direcionadas aos homens e pais para serem implementadas no próximo ano. A finalidade é também tentar perceber as causas, as motivações que levam a esse tipo de crimes. A questão é complexa”, acrescentou Sónia Afonso.
A situação do Centro
“As dificuldades do Centro continuam a ser imensas, mas a parte técnica continua a fazer o seu trabalho até um dia em que sejamos obrigados a parar. O governo tem conhecimento dos nossos problemas com os recursos humanos; financeiros, não se fala. Mas aquele trabalho de ajudar o próximo, tentar dar o devido encaminhamento, atender as nossas vítimas, aquilo que pudermos fazer dentro da Rede, já que não trabalhamos sozinhos, vamos fazendo. Esperemos que no próximo ano, as coisas sejam melhores, a luz verde apareça e quem sabe até podemos mudar-nos para um espaço que seja nosso”, desejou a diretora do Centro.
“Precisamos de mais técnicos. O trabalho é grande. A procura, por incrível que pareça, tem estado a aumentar. Há aqueles que precisam de nós e não podem cá vir, nós temos que lá ir. As marcações para o atendimento, por exemplo, são mais espaçadas. Estamos a gerir, em função do número de técnicos que temos”.
Os casos aumentaram também, porque as pessoas têm mais coragem para denunciar. Outrora, não era assim, por medo ou vergonha. “Uma das coisas boas é que, mesmo os homens vêm para o Centro de Aconselhamento. Não vêm queixar, porque a mulher lhes bateu, mas por causa de situações de desentendimento, maus tratos ou rejeição do filho pela mãe. Vêm em busca de conselhos e de seguimento dessas situações”, constatou.
Nos distritos de Caué e Lembá, que são zonas piscatórias, a reivindicação é ter um espaço para atender os casos, porque não têm como chegar a capital. “Alegam que o gabinete do Comando distrital da Polícia que faz o atendimento não é muito apropriado, entre outras razões, por falta de sigilo, acham que a Polícia defende muitos homens, os processos não andam, etc. Se houvesse um gabinete do CACVD naquelas regiões, aí sim, sentir-se-iam mais à vontade. São situações com que estamos a deparar. Mas de um modo geral, estamos a fazer o nosso trabalho para tentar ajudar”.
O nosso trabalho no terreno tem contribuído para a mudança de mentalidade da nossa população.
Quando se fala de violência baseada no género, muitos homens pensavam que era só para beneficiar as mulheres. Não estavam a ver que o género é tanto masculino como feminino.
“Estamos a criar novas estratégias para o próximo ano, fazendo sensibilizações para ambos, ter ações direcionadas para as escolas, de uma forma geral, e tentarmos ver a questão da estatística. O que pudemos ver nestes últimos dois meses, que o Centro esteve no terreno, há muitos casos de abuso de menores. Os que passaram pelo Centro foram mais de dez num curto espaço de tempo, só na cidade capital. Um relatório foi elaborado e entregue a ministra da Mulher, sugerindo que o assunto fosse discutido no Conselho de Ministros, porque a tendência é muito preocupante”.
Este ano, mais precisamente até o mês de outubro, o Centro atendeu mais de 250 casos, em que se destacam a violência psicológica, a violência física e a fuga de paternidade. Por tudo isso, a diretora considerou o balanço de “positivo”.